terça-feira, 13 de setembro de 2011

Ventos primaveris


Nos dias seguintes a vida seguiu na medida do possível normal...fora as chuvas constantes e os ventos cortantes tudo andava no seu ritmo e ...como a primavera aproximava-se achei que já estava mais do que em tempo de romper a bolsa daquele útero de alienação que me encontrava...

A ligação virtual começava a tomar seus ares reais, e toda virtualidade saia agora do campo unicamente onírico para ganhar forma na vida cotidiana...

No canto da tela voltara a aparecer os lábios do outdoor e eu ignorava... até ser surpreendida por uma mensagem que dizia assim:

"Estou indo de moto para aí agora..."

ainda que fosse sonho ... você não se atreveria a vir até aqui...

"Duvida???"

"Duvido!!!"

pois bem 800km ... de moto ...
eu não valia todo este sacrificio...

"Chego amanhã a noite ...me espere com uma garrafa de vinho por favor..."

"É sério?! "

...

A voz calara mais uma vez, a pausa que ficava era um mixto de raiva e felicidade...
chamei-o uma, duas, três, quatro vezes...

"É sério mesmo???"

"Sim ... bem sabes que sou um cara sério..."

Que idiotice a única coisa que Marco não era neste mundo era sério...
Sim este era o nome do dono dos lábios do outdoor e assim um infinito de coisas que iam em mim se esclarecia...

"Ok ... vou esperar ...mas sem confiar...
Vou convidar todo mundo...será uma recepção e tanto...isto se de fato ... não for uma brincadeira de mal gosto ..."

Depois que ele sumiu mais uma vez do canto da tela...odiei minha fraqueza de aceitar sua visita... Eu quase tinha enlouqueecido por causa dos delírios que seus lábios e depois por seu sumiço... agora indecorosamente ele vinha com esta visita inusitada...
Mas poxa ...800km ...é chão... e se ele de fato percorrese todo este chão para estar ali na porta da minha casa merecia o mínimo crédito...Ele sempre me dera guarida... Com exceção da última vez que nos falamos e que depois de dizer... "te quero sempre bem"desapareceu...
Mas ele não tinha culpa se eu havia entrado em delírios...
e uma coisa não tinha nada haver com a outra ...


Fiquei de olhos fixos na tela, isto não podia acontecer agora...
Mas se estava acontecendo é por que tinha que ser...
Para evitar a tentação de seu lábios de outdoor decidi chamar todos os amigos possíveis,
fazer uma digna recepção ...

Fui retirada de meu devaneio que era real ...pelo grito de Théo no portão...

"Ei abre aí vai!!!"

Pronto agora tudo se esclarecia...os seres fantásticos de todos os meus encerrados delírios começavam a ganhar nomes e falar textos claros, de humanos...ao invés de enigmas de esfinge, pelo meio virtual...

Abri o portão ... e isto eu também não estava com vontade fazer...

Pedi a ajuda de Théo é óbvio que sem carro eu não poderia sequer organizar um café bem estruturado ... Théo sempre tivera o mágico dom que me faltava:

'a capacidade nata de fazer compras no supermercado'

E sempre achara que isto é uma virtude a ser relevada e pontuada até no mais ignóbil ser!!!

"E que tal um sushi?"
perguntei a Théo...

"Hummmmmmmmm??????? "

Ele seguia sem me escutar...
e era isto que eu sempre odiara nele e seguiria odiando até o fim de meus dias

"Sushi ...para esperar Marco..."

"Sushi???Não sabia que você gostava de sushi...e que sabia fazer sushi... "

Ok dez anos de convivência com uma pessoa não era suficiente para ela saber que eu gostava e sabia preparar sushi...

"É pode ser ..."

Depois de anotar tudo...
Ele me pergunta para que a garrafa de vinho???
Ai ... ai ...ai ...

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2,1...

respira...

segura em 8 tempos...solta em 8 tempos...

inspira de novo

segura em 6 tempos ...solta em 6 tempos...
"vinho combina mais com macarrão... "

segura em 4 tempos...solta em 4 tempos

"eu vou trazer tudo para o macarrão..."

segura e 2 tempos ...solta em 2 tempos...

"tá bom...???me diz o que é que precisa pois depois eu esqueço algo
você vai querer me crucificar..."

segura em 1 tempo...solta em um tempo ....


" É sushi...o que eu vou fazer..."
OK???

"Nhoque é bem melhor..."

"ok , você mais uma vez venceu..."


Inspira em 2 tempos ...segura em 2 tempos ...solta em 2 tempos...


"Não esqueça do queijo ralado por favor..."

"Queijo??? E não vai fazer um arrozinho para acompanhar o nhoque...?"



um eco contido dentro de mim

NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO

Do lado de fora, docilmente eu respondo:

" Não! ...E não esqueça do beijo..."

"O que hãn...hum...?"

"QUEIJO RALADO...Théo! Macarrão sem queijo é como amor sem beijo..."


"Agora posso falar por que eu vim aqui???"

"Eu sei, pode deixar eu faço...mas não esquece o queijo ...e o vinho tinto seco..."

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me rendi ao nhoque...Thëo tinha razão...e mesmo que não tivesse ... ele teria razão ...


Ao sair olhei a papelada que ele me trouxera...sim eu estava de volta a roda de fogo de trabalhos intermináveis... e ...ah ...não queria pensar em Théo...já ter que administrar todos os meus reclusos pensamentos e de súbito assim permitir que todos que habitavam meus pensamentos ganhassem nomes de uma hora para outra era demais...

ahrg...

Fechei o portão assim que ele saiu e ele como sempre segurou a minha mão por um tempo...
como sempre fizera, e como ainda fazia, até quando não estava perto de mim...como se sua mão tivesse a força e a capacidade de me deter ali imóvel...Sem beijos como sempre fora e como seguiria sendo se ainda fosse! Entrei para dentro de casa incomodada com minha decisão e com a suposta visita do dia seguinte... e com a mão de Théo e com aquele monte de trabalho ... e depois mil telefonemas...
Precisava convidar todo mundo para inusitada visita de Marco, o motoqueiro desvairado que estava a caminho... e se eu não conseguisse convidar mais alguém para vir até o esconderijo de nome casa...? Seríamos sentados a mesa, no dia seguinte...eu , Marco e Théo...Um a prender minha mão , o outro minha atenção com lábios indecorosos...e no meu pensamento...olhos mediterrâneos...

Precisava organizar tudo...
inclusive meus pensamentos...

Hospedar alguém??? Aqui??? Parecia surreal.Era uma realidade inconcebível...Mas realidade...

E para minha frustração ninguém poderia vir...as desculpas:
"Sabe como é, meio de semana..." "E depois, você mora tão longe..." "Vai voltar para cidade quando..." "Decidiu criar galinhas..." "Aí neste esconderijo você não vai encontrar namorado jamais...e depois que namorado vai querer te visitar aí ???" "Mas você não tem medo???"


Seria uma espécie de despedida...
de Marco
e de Théo...
e de mim
e de uma parte de vida que queria esquecer...

O telefone tocou, era minha irmã, lembrando das bodas de ouro...

ah...mais esta ainda...

"Como assim daqui a dois dias???"

Quanto a este problema deixaria para depois...
depois dos ventos primaveris momentâneos...


Uma casa para arrumar...
Uma pilha de projetos para redigir...
Uma série de sonhos para mergulhar...

e e-mails muitos e-mails...

e lá de dentro estava a minha licença poética:

Angelo
o homem dos grande olhos que me seguiam onde quer que eu fosse...

...

sim todos tinham nome

...

mas de momento era só destes três que eu me permitia recordar...

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Mãos a obra!!!

Devaneios cancelados...

Ia respoder a minha irmã...
e depois responder a Angelo...

Mas todos os demais seres que habitavam o perturbado jardim de delícias da minha existência: a irmã de Marco, ou a Branca de Neve? E A abelhinha?
E meu menino? E a índia? E o louco que gritava meu nome?
E a Fadinha libélula?


E ali no meio daquele inusitado movimento que percorria bem mais de 800km em minhas já insanas idéias... minha licença poética teria que esperar...
te licencio!!!

não tinha esperanças ou perpectivas...
logo não podia dar esperanças a ele nem a ninguém

agora não eram os devaneios que me
levavam
mas a vida...

eu não podia nutrir esperanças em ninguém
e sendo assim guardei a mensagem de Angelo numa pasta do meu computador
como quem guarda uma relíquia

respirei profundamente

olhei o céu através da janela
e me pus
mais uma vez a organizar tudo...

e depois mergulhei na papelada
nos projetos...
minha vida se resumia a isto

devaneios e projetos

e seres fantásticos

e ao
final dava sempre a sensação

que tudo
era a mesma coisa

A primavera nem chegara e já trazia seus ventos
transformadoramente perturbadores
magnificamente atordoantes...


E entre flores, nomes, sonhos, papéis...
eu era instigada a reagir...


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Para saber o que virá acompanhe as próximas postagens...

Este devaneio está ligado intimamente ao post anterior:



Link
Que por sua vez faz parte de uma série de devaneios:

1-Peraí Link 2- Atualização

3-Bolsa de mão

4-Grito Suspenso no ar

5-Bolhas de SabãoNegrito Itálico

8- Vasculhando os arquivos de meu íntimo

9- A Busca




Fique a vontade para lê-los na ordem que bem entender!

AQUELE ABRAÇO!!!







domingo, 4 de setembro de 2011

Virá


Despertei ao som de blues, daqueles rasgados e roucos, que misturavam-se ao perturbador vento que insistia em anunciar a chegada de mais uma primavera. A claridade do dia ensolarado e de estonteante céu azul, gritava meu nome através da fresta de luz provinda da fresta da minha janela. Eu não queria levantar! Na penumbra do quarto, o costumeiro gole de água para acordar o corpo por dentro... como se tivesse também a capacidade de lavar, ainda que brevemente, a minha alma. Fiquei olhando tudo que me rodeava com o desejo de liberdade...
Novamente permitira a bagunça fora de mim...e sendo assim a desordem interna era inevitável... Tive uma vontade louca de chorar, nem sei bem porque, mas o vento, e o quarto e tudo me agoniavam e depois... a lembrança da dúvida, da busca, da paisagem no batente da porta.
Dos sonhos que tivera, eu só lembrava nitidamente de três coisas: o carro da Penélope Charmosa, a vista de uma janela de onde eu via uma paisagem montanhosa (com o dedo de Deus imponente a apontar para os céus) e das palavras de meu avô, que embora não aparecesse no sonho tinha me dito:

"O que é teu te virá as mãos."

Tinha ainda a vaga lembrança de que a fadinha libélula estivera dando o ar da graça no meu sonho, mas preferi não lembrar.
E os blues seguiam e o vento também e... em algum lugar estariam também o belo homem dos belos olhos... Queria, como num mecanismo de defesa e paciência, não pensar agora nele. Decidi abrir a janela, para deixar a luz do dia entrar... Inevitável, um apoteótico céu azul me saudava...Me deu ânimo, não vou negar...Eu tinha que me libertar agora eram de outras coisas e não da doce lembrança dele. Tinha sim que aliviar a bagagem da mala de nome vida para seguir em frente. E me libertar tanto de coisas, como de hábitos e atitudes que não cabiam mais na vida que eu almejava levar.

"Reaja, mais uma vez, reaja..."

Sim olhei o céu com a certeza das palavras de meu avô em mente...
Neste instante meu celular chamou, eu acreditava que pedia carga, mas não, havia nele duas mensagens: uma falando de dias quentes e possíveis beijos ao sol, a outra dizendo que eu não esquecesse que eu era o seu melhor pensamento.

Relembrei mais uma vez das palavras de meu avô,
e depois da imagem do Dedo de Deus apontando para o céu,
e das mensagens...

Eu não precisava sair correndo porta fora fora para reencontrá-lo, estava lá, era só olhar para o céu claro!

Deus me ouvia sempre! E não apenas ele...

E sendo assim ,senti que o momento não era o de me jogar ao mar, precisava antes costurar as velas. Libertar-me do pêso que fizera minha nave encalhar ali naquele paradisíaco porto de belas paisagens e que me agoniava noite e dia em sua solidão bucólica. Ter certeza que tudo que está vazio não tarda a encher-se e que nada se pode fazer para mudar o que passou, mas há muito a ser feito para desenhar o futuro que, vai muito além da romântica e singela paisagem contida na moldura do batente da porta...
Lembrei dos lábios do outdoor que disseram que eu não devia adiar... sim ele até tinha sua parcela de razão!
Havia um abismo e eu ia me jogar nele de braços abertos, era só questão de tempo, não adiaria, mas também já não estava mais em tempo de ser imprudente. A paciência é uma qualidade das pessoas sábias, e saber o momento de jogar-se seja num abismo ou numa nova estrada também... De nada adiantava me lançar em meio a tempestade e ficar rodopiando sem ter a seta de meus ideais voltada para o alvo de minhas realizações como fizera da última vez.

Meu recuo era em força!

Meu exercício de segurança, de perseverança.

Domar a fera louca que havia dentro da doce, pacata e romântica personagem que eu era pelo menos aos olhos poéticos de quem me via e lia a distância.
Tinha que me lançar no abismo de meus mais secretos e sonhados desejos, mas na hora certa e decidi que não importava onde eu fosse, levaria comigo sim, o meu coração! Com as cicatrizes inerentes a ele.
Naquela manhã ventosa decidi que ia deixar para trás a sua amargura.
Da primavera queria não só o vento mas também as flores do caminho.
Fui até a outra janela para ver se avistava alguma flor no meu jardim...
Tive que rir, para não chorar convulsivamente... sem flores, grama queimada, uma bagunça só...sem margaridas ou rosas...e os cachorros quietos...vasos com plantas secas...
Porque arrumá-lo se eu já havia definido que partiria?
Simplesmente pela vaidade de acreditar que devia tornar o mundo por onde passo melhor ...
Dois lírios ainda resistiam, sem flores, mas de verde intenso! E no vaso dependurado onde um dia houveram lindas flores, dois pássaros, não azuis, mas amarelos ,cantando...
O assobio deles até me fez esquecer o assobio do vento...
Sim,
o que era meu me viria as mãos,
e porque não acreditar no caminho que me apontava o dedo de Deus...
o céu...
divinamente azul
ou
colorido como minha imaginação...

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Para saber o que virá acompanhe as próximas postagens...

Este devaneio está ligado intimamente ao post anterior:



Link
Que por sua vez faz parte de uma série de devaneios:

1-Peraí Link 2- Atualização

3-Bolsa de mão

4-Grito Suspenso no ar

5-Bolhas de SabãoNegrito Itálico

8- Vasculhando os arquivos de meu íntimo



Fique a vontade para lê-los na ordem que bem entender!

AQUELE ABRAÇO!!!


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Além do vento,
dos blues rasgados,
de latidos descompassados,
o canto de um casal de passarinhos,
o grito pungente dos queros - queros que são meus vizinhos
a gritar lá fora
o que vai na minha mente,
a lembrar que eu como eles :
quero quero quero quero quero quero quero quero
estavam nos meus ouvidos
enquanto escrevia estas palavras as seguintes canções


Best That You Can Do

Se

Um índio

Samurai


Per la vita che verrà



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A imagem do post é de Renan Faria e foi retirada da internet

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