segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Uma parte: reflexo do todo





“Eu amo a tua bunda!”




 Estas foram as palavras que ele me disse em meio a um momento especial... Não vou dizer que não gostei, mas lá estava ela, roubando a cena de novo! E para mim aquilo ainda que parecesse um grande elogio não me fazia extremamente feliz... Eu queria que ele dissesse que amava a mim, sim, eu queria ouvir: 

“Eu te amo! Você é linda! E eu adoro tudo seu! Sua bunda é linda!” 

Mas não foi assim... Contudo, eu não podia nem devia lamentar ou reclamar do fato. 
A maioria das mulheres luta com a balança, com o peso, com a celulite, e eu tinha ali o homem sensacional a declarar-se humanamente a minha bunda!

 O fato memorável passou! Mas não foi esquecido de um todo, até porque é fato sabido que, em nossa sociedade, o corpo sempre faz mais sucesso que a alma... Dias depois ele ainda declarou uma segunda vez seu amor por ela...

E eu? 
Poxa... Eu fiquei mega chateada e ciumenta...Com a maior inveja do efeito que ela fazia nele ... Consolei-me no fato de que já havia ouvido falar que o corpo físico, a beleza, nada mais é que um reflexo evidente da luz do ser. Que refletimos externamente apenas aquilo que somos em essência. E se ela, parte de mim, é bela, eu também sou...
Os dias seguiram, mas sempre chega o dia em que somos tomados pelo ego. E foi justamente neste dia, que meu ego carente, desejando ser afagado deparou-se com um novo elogio do bonitão. Quando ele tocou no assunto, falou da lindeza e admiração que tinha pela tal, eu me indignei! Imaturamente disse que achava que o ser dele não combinava a estes apegos físicos materiais do corpo. 
E por pouco não lhe disse a célebre frase:

"Homem que escolhe suas relações pela bunda, não pode reclamar de ter um relacionamento de merda!”

Sinceramente que merda que eu fiz!

Sabia que este negócio de bunda só podia dar nisto. Embora na minha profissão merda e boa sorte sejam sinônimos. 

Pela primeira vez entrei em choque com ele!
 E iniciei um confronto idiota...
   que para mim era necessário!

Falei que aquilo não combinava com a filosofia de vida que ele levava,  que não fazia parte de uma pessoa tão elevada espiritualmente! E blá blá blá... 

Faltando menos de um mês para a tal data em que haviam anunciado o fim do mundo, eu na companhia do cara com  queria estar, ele me querendo e eu bancando a difícil... querendo filosofar!
Ainda  disse que eu era mesmo difícil, de gênio complicado...

(Isto jamais deve se revelar a um homem que esta em meio a uma explosão de afeto, seja este afeto espiritual ou carnal...  Ainda que ele seja a mais especial e sensacional das criaturas, jamais devemos revelar as fraquezas. Faz-se crucial, sempre pensar no tendão de Aquiles de nossas fraquezas, e nunca deixá-las vulneráveis.) 

Pela primeira vez senti uma ponta de irritação nele, não irritação com ódio... Mas percebi , depois, que estava chateado com o fato.

No desenho que eu havia criado para mim do homem perfeito que habitava nele, achei que ele não podia sempre estar com este papo de bunda. Que ele não podia gostar só de uma parte... Na verdade eu queria fazer ele entender que ele podia ter o todo, não precisava se contentar apenas com um pedaço, ainda que o pedaço em questão, fosse extremamente atraente e perfeito.

Para me desarmar ele me larga sua defesa: 

‘cada parte de nós é infinita, e uma reprodução do todo!’

Eu ao invés de serenar, tomei aquilo como uma cantada barata e irritada lhe respondi:

“Então minha bunda é a reprodução daquilo que eu sou! É isto que você quer dizer?”

Ele respirou fundo...

Percebi sua mirada, forte e intensa como nunca. 
E na mesma hora pude perceber que eu havia agido no ímpeto...Soltado palavras inúteis ao ar, dando energia a negatividade e não enxergando o poético que havia no fato de sua devoção e  amor pelas curvas de meu corpo!

“Sabes bem o que penso. Não pensa só na tua bunda! Eu não quero a 'tua bunda'.O que eu queria era fazer amor contigo...”

Pronto, com aquelas palavras ele me desmontou... 
E o mais sensacional é que disse numa maneira tão incisiva e doce ao mesmo tempo... 
E mais ainda, depois de fazermos amor ele passou a mão nos meus cabelos, me deu um beijo e disse que eu era o seu anjo...

Estava tudo muito perfeito e eu precisava  complicar...

“Eu não quero ser o teu anjo!”

Na verdade eu queria ser bem mais que um anjo...
O paciente homem me olhou com doçura...
Eu perdi o momento de ficar ali no maior Love...
pois queria que ele dissesse as coisas da forma que havia criado em minhas expectativas...
Antes de nos despedirmos,  nos abraçamos centenas de vezes e nos beijamos... 
beijos grandes e longos, daqueles que fazem o chão desaparecer... Não nego que foi extremamente difícil para nós separar- mo- nos naquele dia. 
Antes de ir embora ele me perguntou se eu não tinha nada para lhe dizer. E eu ao invés de dizer que lhe amava, ou adorava sem igual, de gritar que  lhe amava tanto quanto ele amava minha bunda.  Disse apenas que não queria ser o seu anjo.

Dias depois eu meditava em minha quietude sobre os motivos dele ter silenciado e de aparecer com uma garota que não era tão linda
 ( não tinha a minha bunda) 
e nem era tão inteligente, politizada e  espiritualizada como eu. 
Percebi que a culpa era minha, sim, eu havia sido uma idiota...

Se, segundo ele uma parte representa o todo.
E ele havia dito que amava minha bunda!
Ele amava uma parte...
E ao amar uma parte, esta representava o todo.

Logo, ao amar minha bunda, ele me amava...

... só que eu tão cega, nem percebi sua mensagem...

Agora percebo que posso ter deixado passar, o momento...
Apenas por uma falta de pensamento lógico.
Por não me entregar verdadeiramente ao momento que ele me propunha...

Humanamente não paro de pensar, no meu lado anjo
e suas palavras não saem da minha cabeça:

 “Eu amo a tua bunda!”
 “Eu amo a tua bunda!”
 “Eu amo a tua bunda!”
 “Eu amo a tua bunda!”
 “Eu amo a tua bunda!”
 “Eu amo a tua bunda!”
 “Eu amo a tua bunda!”

                                  

                               Que merda!