sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Efêmero jardim de sonhos


Mês passado eu poetisei setembro
Devido as margaridas que já de início nasceram no meu jardim
Lembrando que
as margaridas e o jardim que falo aqui não são metáforas
embora pudessem perfeitamente vir a ser

Aquele foi um fato feliz
um sonho realizado...

Setembro não é só primavera
Na verdade é uma faca de dois gumes
pode até ser um atentado
seja ele floral ou explosivo
sexual ou singelo

Voltando ao jardim
Não vou me queixar das rosas
até por que nem só de flores se faz a beleza de um jardim

Quem me ensinou isto foi o Gaspar
Nada mais nada menos que um cachorro
(sensacional diga-se de passagem)
Um dos 5 filhos de Cendy
minha best dog friend
desde que ele e seus irmãos nasceram
eu ficava imaginando o jardim
daqueles de novela
filme
achava que se meus cachorros tinham cara de cachorros de filme
tinham que ter um jardim a altura

A casinha que morava na praia
tinha muito de filme
mas apenas uma pequena
faixa de grama

Na época que a a dog trupe nasceu,
descobri,
conduzida pela chefe da minha
mágica matilha,
que do fundo de meu quintal
era só escalar uma montanha de areia
por entre folhas
folhagens
árvores e arbustos...
seguir por uma trilha
clara e florida
que lá estava o paraíso

um mundo secreto de areias claras

( e isto também não é metáfora)

foi um sonho
destes que a gente vive
e não consegue compreender
um lugar que se pisa com os pés
mas que só se consegue entender
com despreendimento suficiente
de elevar os pensamentos até os céus

Gaspar corria pela areia
e por ser tão claro
as vezes sumia nela
e tornava a reaparecer

Mesmo diante deste onírico paraíso
seguia sonhando com o jardim florido
imaginando ele correndo na grama
por entre as flores

Realizei meu sonho
duas vezes

Na casa que vivi antes da que vivo agora
ele corria na volta da casa
jardim enorme
Gaspar com seus vastos pelos
corria por entre as flores
literalmente deitava e rolava (na grama)
A tardinha admirava o por de sol
depois ficava observando a noite chegar
recostado na varanda
Lua, estrela, bola de pêlo

Sei que ele pensava coisas que minha vã filosofia humana
não tem a capacidade de compreender
ao chamá-lo para entrar
ele sempre relutava
e me ganhava
convencendo-me brilhantemente
virava-se de barriga e estendia sua pata fofa
num gesto que carimbava
meu ego
acariciava por inteiro minha alma
Mas todo jardim que tem rosas
também tem lá seus espinhos
não pretendo me queixar das rosas...
Mas sabe como é
passei a sonhar com flores mais humildes
desejando um jardim com uma vasta vista
cinematográfica
como cabe a uma boa atriz

Nossa nova morada terá vista altaneira
afastada da muvuca
próxima ao asfalto
Sinal de internet
Comunicação vital com o mundo tecnológico
Tudo aliado a beleza e paz do universo rural

Mudamos
Casa com imponente jardim
Vista enlouquecedora
Pomar
Pessegueiros em flor
Espaço para a cachorrada correr enlouquecidamente
(como fazia nas dunas)

Estava sem flores o jardim
pois mudamos na metade do inverno
mas quem tem cachorros nem sente a ausência delas

Um sonho ver o meu Gordo Gaspar correr naquele jardim
Rolar naquela grama
Levantar sua fofa patinha de pão de ló para fazer seu xixi
emoldurado por um plano de fundo de filme europeu

O dia que narrei no post anterior chegou,
apareceram margaridas no jardim

sim
a mãe da dona da casa disse que eu seria muito feliz ali
e a mezuzá brilhante na porta de entrada parecia confirmar suas palavras
a casa retratava
aquela felicidade de desenho de criança:
casa
montanha
cachorros
flores
margaridas
vida quase de filme...
prá que mais?
pensa bem!

Mas foi só aparecer aquela margarida
E alguns dias depois meu Gordinho começou a definhar
Não quis mais saber de comer
Parecia apaixonado
Algo totalmente natural em se tratando de fim de inverno
alguns dias antes da primavera chegar
ele partiu

Me vi obrigada a voltar nas dunas
para guardar nas fofas e brancas areias
a bola de pêlo de meu coração

Depois voltei ao jardim
(agora vazio e silencioso)
saudosa das dunas
vento
(primaveril)
enlouquecido
parece ter levado
o retalho mais florido
da colcha de minha alma

enquanto tirava os calçados

(para remover deles as finas areias
que involuntariamente carreguei comigo
das pálidas e majestosas dunas
onde enterrei os pedaços de meu coração)

tive certeza que devia chorar
derramei a areia de meus calçados pelo jardim
onde agora reinam soberanas as margaridas


É como se elas agora não tivessem mais o mesmo sentido

dias depois um botão de rosa bem vermelho e solitário
surgiu para quebrar aquela brancura

Passados alguns dias
percebi que elas,

as margaridas,

começaram a aparecer em maior número
e a medida que minha saudade aumentava
surgiam também
Borboletas de todas as cores
me fazendo lembrar que tudo é efêmero

Pior seria
se lá no jardim
vazio
pela ausênsia imprevista de meu Gordo
não tivesse elas
para singelamente ilustrarem
minha manhãs
vazias e floridas
de um mês de setembro
que para sempre vou querer esquecer
e durante toda a vida irei com os olhos
rasos de água
recordar

...